quinta-feira, 1 de maio de 2008

DO MUNDO ACTUAL

"Cada época tem o seu próprio estilo de estar insatisfeita com o mundo. Cada descontentamento com o mundo, que tenha tomado consciência de si, traz consigo o germe de uma nova cultura.
A actual insatisfação com o mundo apresenta traços pânicos inconfundíveis. Quem não sente o pânico, é porque não está ao corrente. Vive, provavelmente, afastado da agitação, numa caverna anacrónica, posto em sossego, poupando-se, vivendo de rendas, talvez até feliz, relegado para uma província, aonde não chegam as notícias. Para alguém se manter afastado do pânico, teria de ser capaz de edificar uma pequena felicidade. Haveria de ter ainda o velho sistema imunitário psíquico, que se protege de grandes questões, graças a preocupações imediatas. Mas a imunidade ao pânico tomou-se uma raridade — tal qual como o alheamento credível do mundo. Quem leia jornais e coma cogumelos já está contaminado. Mesmo os ânimos construtivos já não podem, afinal, chegar mais longe do que a uma pequena positividade sobre um pano de fundo pânico. A boa vontade já não tem nenhum denominador comum com o curso do mundo".

(Slöterdijk, P. (2002 [1989]). A Mobilização Infinita. Para uma crítica da cinética política. Lisboa: Relógio d'Água, pp. 67-68, (Orig.: Eurotaoismus - Zur Kritik der Politischen Kinetik, Surkamp Verlag Frankfurt am Main, 1989)

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