domingo, 27 de abril de 2008

O país do faz de conta

Neste blogue praticam-se a Liberdade e o Direito de Expressão próprios das Sociedades Avançadas
Hoje, naqueles dias prolongados do "jour-de-lenteur", passei pela F.I.L., para ver o típico espectáculo do faz-de-conta nacional. É público que eu eu não percebo nada de carros, mas percebo perfeitamente que uma gaja enfiada em cima do "capot" de um carro é para tentar vender gato por lebre. Se fosse a minha amiga "Laura", aproveitava já para fazer uma escandaleira e era elementar: bastava dizer ao labrego-só-sorrisos do pavilhão, das duas, três: "olhe, quero o carro e a gaja"; "olhe, levo o carro e quero que me troque a gaja por uma atençãozinha no preço, ou, pior ainda, "levo a gaja e o carro não me interessa".
Portugal move-se em redor disto: Carros, Futebol e Gajas, e hoje era dia de plena assunção nacionalista, já que vinha tudo ao mesmo tempo, num pacote simplificado.
Eu costumo sentir-me mal nestes momentos, tanto que o carro de que mais gostei -- e eu não gosto de carros -- era cereja, e tinha, em cima, uma tronchuda que não valia um caracol, e não compreendo como se podem levar tantas horas de minúcia de "design", tanto estudo aerodinâmico, tanta engenharia mecânica de ostentação e economia, para depois enfiar em cima... aquilo. É suposto que a Natureza, no seu "Intelligent Design" -- teoria de que sou fervoroso adepto, desde que vi a Manuela Ferreira Leite, os lindos olhos de Mariano Gago e a Inês Pedrosa -- nunca devesse ter criado um obscuro objecto de desejo com bigode, celulite e uns cms a mais naquelas célebres medidas das "passerelles". Acontece que o Português médio é insensível a isso, como a tudo: para ele, uma mulher são duas mamas, sem volante, com um buraco, e, de preferência, com um grande cu: o bigode, obviamente, não conta, e não estou bem a ver os engenheiros daquele espantoso Alfa-Romeu a colocarem, sequer, a hipótese do modelo ter buço, mas isso para o Português não interessa, porque o Português de Lineu acaba por nunca perceber o que está a acontecer, nem é sensível ao que o rodeia: quando Neanderthal terminou, não deu por nada, e casou-se com Cro-Magnon, dando origem aos lindos espécimes que nos rodeiam; quando o outro bateu na mãe, não percebeu o que estava a acontecer, e pensou que eram só umas assinaturas, um chamar "cabrões" aos gajos do lado de lá da fronteira, e toca a andar; quando houve umas Rainhas enfiadas na cama com Espanhóis, acharam natural, já que o sonho de qualquer Português "d'époque", antes da maré das Brasileiras e das Pretas, era ter uma; quando D. Sebastião agarrou na tralha toda e vou para Alcácer-Quibir, toda a gente achou natural, e depois apanhou com os Filipes em cima; quando puseram uma mulher-a-dias como Rainha, dizendo que mais valia ser Rainha um só dia do que mulher-a-dias em forma de Duquesa toda a vida, também acharam que fosse um fenómeno natural; quando veio a Revoluçao Francesa, não perceberam nada, e acharam que era mais um pretexto para a Carlota Joaquina arranjar homens, e meteram os tarecos todos nuns navios semi-naufragados, e foram para o Rio de Janeiro, tentar conquistar o Uruguai; depois, mataram um Rei, e acharam que era uma coisa que só estava destinada a vir nas capas de revista; apanharam logo com uma Ditadura em cima, durante 48 anos, e pensaram que aquilo não era com eles, desde que ainda houvesse uma côdeazinha de pão, e um copinho de vinho; quando veio o 25 de Abril, ninguém percebeu o que estava a acontecer e os tanques até paravam nos semáforos vermelhos (!), porque o respeitinho é uma coisa muito boa; quando deixaram as colónias ao deus-dará pensaram que era um bocado como um divórcio, e depois até iam arranjar uma "gaja-mais-boa", para as substituir; quando Cavaco fez a P.A.C. -- um tal de Arlindo, se bem me lembro, que a vendeu em troca de 80 milhões de contos, e quer agora desfazê-la, porque parece que Bilderberg, com os bancos a especular no preço da Alimentação, nos vai fazer regredir até ao estado do arado e da charrua, e de roer cenouras e enfardar batatas -- toda a gente não percebeu o que tinha acontecido. Ele vai agora tentar explicar aos jovens, duvido é que eles entendam...; quando foram sendo assinados todos os tratados que tornaram Portugal uma zona ainda mais periférica da Europa, toda a gente achou natural, desde que houvesse carros, Futebol e gajas, até que, de repente, de há meia dúzia de anos para cá, quando começaram a perder os empregos, a ver os salários em plena derrapagem, a Corrupção a ferver, como uma panela de pressão, os Fundos Comunitários a esvaírem-se, e todos os males a baterem à porta, subitamente, tiveram ataques de sonambolismo, e toca de começar a votar no partido do lado, para fugir com o rabo à seringa: assim, fugimos do Cavaco, para cair nos braços do Guterres -- que nem era mau gajo, mas tinha uma corte sinistra --; depois, fugiram do Guterres, para cair no País da Tanga, do "Cherne"; depois, deram o golpe do baú, e foram-se entregar, em forma de rendição incondicional, nas mãos da pior coisa que Portugal já produziu.
Quanto ao P.S.D. sou eu que não percebo nada: só vejo um camafeu, o Santana, em regime de paródia, e até lamento que, paródia por paródia, finalmente não ponham o Alberto João, para usar aquela boca gordurosa e desbocada, a insultar os "cont'nentais". A mim, pode insultar de tudo, porque adoro a adrenalina dos insultos, e acho que fazem falta no nível político a que chegámos. Infelizmente, para o ano, é esta nau desgovernada que vai ter de mudar as velas, se velas ainda houver, ou se não andarmos já no regime forçado das galés, 24 horas por dia de remo, como prevê o Novo Código de Trabalho.
(edição em forma de tripé de pitonisa no "A Sinistra Ministra", o "KLANDESTINO" e "The Braganza Mothers" - prometo que, com tempo, e quando o Braganza já estiver firme, farei textos diversos para cada um )

5 comentários:

Anónimo disse...

Os meus belos e azuis olhos de sapo gordo,
as minhas roliças e alvas pernocas com rosados carnicões,
os meus cínicos e brochísticos lábios de assobio,
a minha descomunal barriguita de esporra.
as minhas flácidas e estriosas nádegas,

fazem com que eu seja, mesmo nesta madura idade, um dos mais belos espécimes lusitanos.
Eu é devia estar estirado em cima de um capot de automóvel a mostrar toda a minha esplendorosa beleza.
Num Ford Capri, vermelho cereja, igual ao do do meu papá...

Divine Decadence, Darling!

Se o meu espelho não me diz que eu pareço uma mistura de eunuco teutão com tronchuda toupeira albina, adversus solem ne loquitor.

Credo quia absurdum est.

metatheorique disse...

Ahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahah

Nem o cabrão do Lombroso descreveria tão bem o especimen nacional. De todo o modo nota-se uma curiosa conjunção/inspiração em Miguel Real no desenvolvimento do texto.
Excelent!

Anónimo disse...

isso é mais a descrição de um panasca!

Paulo Pedroso disse...

Excelente, como sempre!

A crítica social ao melhor nível!

Paulo Pedroso disse...

Noutros tempos mortificavam-se com chicotes para se sentirem mais próximos do divino.

Agora, o peso na consciência manifesta-se em "estranhas" formas de mortificação.