Quando pensamos nos nossos tempos, um dos aspectos que mais facilmente destacamos, como característica intrínseca e relevante, é a existência de uma intensa, profunda, extensa e abrangente mudança social. Nas mais variadas dimensões e esferas da nossa vida, da política à economia, da cultura à religião, da tecnologia ao lazer, das relações familiares e íntimas aos eventos sociais, da natureza, diversidade e mistura dos valores e dos princípios à natureza, diversidade e mistura das identidades pessoais, comunitárias, tribais, étnicas, nacionais ou civilizacionais, a mudança social está presente a um ritmo e com um nível de impacto jamais observados.
Apesar de todas estas mudanças, quando pensamos no nosso tempo, raros são os que pensam em mudanças radicais ao ponto de se observarem alterações estruturais, ao ponto do nosso mundo ruir por completo, surgindo das suas cinzas algo de muito diferente. Quantos serão aqueles que acreditam que o mundo, tal como o conhecemos, permanecerá “estruturalmente igual” para os nossos filhos e netos, como se apresenta aos nossos olhos? A maior parte daqueles que perdem algum do seu tempo a pensar o futuro tem tendência para ver um mundo semelhante ao nosso, eventualmente mais justo ou mais injusto, mais igualitário ou menos igualitário, mais desenvolvido e equilibrado ou menos desenvolvido e equilibrado, mas certamente mais dominado pela tecnologia.
No entanto, quantos pensarão que o mundo, nas próximas décadas, poderá sofrer mudanças radicais tão fortes, tão estruturais e tão profundas (ou mais) do que as ocorreram na transição do império romano ocidental para o período de dez séculos que ficou conhecido pela designação de Idade Média?
A questão não é irrelevante e só os distraídos poderão pensar que assim é. No fundo, a questão central é esta: qual a nossa capacidade de antecipar, prever, conhecer (ainda que no campo das probabilidades) o nosso futuro? Será que o homem moderno possui mecanismos, instrumentos de análise e conhecimentos que permitam uma percepção razoável da mudança social que se aproxima, principalmente quando essa mudança social se prefigura como sendo de natureza estrutural? Porque, entendamo-nos, apenas poderemos ter alguma capacidade de intervenção sobre a mudança se tivermos uma percepção mínima do que se aproxima. De outra forma, se continuarmos distraídos, seremos apanhados pela mudança dos tempos com toda a força, como brinquedos infantilmente manipuláveis.
Vejamos a questão através de um exemplo: Quantos cidadãos romanos, de meados do Séc. V, terão antecipado o fim do império romano ocidental? Será que, apesar de todas as mudanças, convulsões e problemas existentes no império romano do ocidente, algum cidadão foi capaz de prever a ruína total do império, com a transformação radical do seu mundo económico, político, cultural e social em algo de profundamente distinto, no espaço de poucos anos ou décadas? E será que, nos dias que correm, seríamos capazes de antecipar algo de semelhante se mudanças desse tipo fossem iminentes?
Vejamos um exemplo bem mais próximo de nós: No final dos anos 80, todo um bloco económico, civilizacional, cultural e político, o império Soviético, ruiu por completo em pouco mais de um ano. Será que alguém se recorda dos Economistas, Sociólogos, Historiadores, Politólogos, Filósofos, Intelectuais ou Pensadores que tenham antecipado a queda do império Soviético? Mesmo aqueles que, por motivações de discordância política, ideológica ou económica com esse Bloco, tivessem razões para desejar semelhante ruína, jamais apareceu alguém a antecipar a queda do bloco comunista a não ser quando ele já era evidente aos olhos de todo o mundo.
Por isso, uma vez mais, voltamos à questão central: apesar de todo o conhecimento acumulado e de todos os instrumentos analíticos que estão ao nosso dispor, ninguém foi capaz de antecipar uma mudança tão significativa, profunda, abrangente e com consequências tão dramáticas como aquelas a que assistimos no final de 1989 e princípios de 1990. E, para os mais distraídos, convém recordar que o Bloco Soviético era SÓ uma das grandes potências mundiais, com tudo o que isso significa no plano do poder geoestratégico, da influência das políticas nacionais e internacionais, da economia mundial, das escolhas e das alternativas políticas para o mundo. Como foi possível que um bloco todo-poderoso desaparecesse assim, numa decadência tão estrepitosa, sem que ninguém tivesse sido capaz de o antecipar, de o prever? Uma coisa é certa: ao contrário de nós, os nossos antepassados romanos não tinham ao seu dispor os instrumentos analíticos da ciência que hoje estão ao nosso dispor. E, no entanto…?!!!! O que terá falhado para que ninguém tivesse antecipado semelhantes mudanças?
Na minha perspectiva, é possível, com algum grau de razoabilidade, antecipar mudanças estruturais significativas, mas apenas e quando somos capazes de pensar criticamente a realidade social para além das limitações que nos são impostas pelo formato civilizacional e pelo caldo cultural em que crescemos e vivemos. Julgo que o mundo em que vivemos se aproxima de mudanças radicais muito semelhantes às que se viveram aquando da queda do império romano e ao surgimento da Idade Média, sendo que, essas mudanças irão ocorrer nas próximas décadas (provavelmente por volta de meados do Séc. XXI), mas apresentar-se-ão numa dimensão jamais vista pela humanidade, tendo em conta, por um lado, a natureza da sociedade global em que vivemos e, por outro, a dimensão absurda do volume demográfico existente actualmente no Planeta Terra.
Nunca fui catastrofista e muito menos adepto de teorias da conspiração. Prefiro analisar, pensar e discutir a realidade à luz de pressupostos científicos, baseando-me em factos, na clarividência dos sábios e na objectividade das técnicas e dos métodos. Por isso, peço desde já aos meus leitores que não confundam estas palavras com visões mirabolantes, crenças em conspirações tenebrosas ou mesmo um pessimismo meramente irrealista.
Também quero desde já deixar bem claro que não estou a defender a tese, e muito menos a fazer a apologia, de um regresso à Idade Média. Se pensarmos bem, a Idade Média representou uma autêntica implosão civilizacional: o mundo contraiu-se de tal forma que as esferas social, económica, política e cultural assumiram outras estruturas, outras regras, outras crenças, outras práticas. Um cidadão romano do início do Séc. V dificilmente se poderia integrar no mundo no início do Séc. VI, tão profundas tinham sido as mudanças. As instituições políticas, as leis, o mercado, a ordem pública, a estrutura social, as práticas culturais, os costumes, as tradições, tudo isto tinha sofrido alterações significativas ou estava a caminho de as sofrer.
Em certa medida podemos dizer que o Império Romano Ocidental se encontrava, à sua escala, à sua dimensão e no seu contexto, “globalizado”. E, por isso, também podemos dizer em certa medida, que a Idade Média significou uma implosão dessa “globalização”, implosão essa que se traduziu numa redução significativa dos conhecimentos e das técnicas, principalmente a nível cultural, nas artes, na Engenharia Civil, na Arquitectura, no Direito, na Filosofia (e como tal na proto-ciência da época) e na Literatura, mas também uma implosão no mundo social, que passou a ser territorial, económica e socialmente mais fechado, limitado, inseguro, pobre e inculto.
Porque razão não somos capazes de antecipar mudanças tão graves quando elas se aproximam? Seremos capazes de as evitar ou a marcha da História é imparável? Julgo que um dos aspectos que mais dificultam a nossa capacidade de antecipar o futuro (dentro de alguns limites razoáveis), decorre das limitações civilizacionais em que fomos socializados e em que vivemos. Os romanos não foram capazes de antecipar mudanças tão radicais, assim como os poderes do Kremlin não foram capazes de evitar a queda do bloco Soviético, porque todos estamos imersos num caldo cultural, composto de formas de pensar, sentir e perceber o mundo que integram um FORMATO que nos impede de questionar toda uma série de valores, princípios e convenções. Só podemos ver mais além se formos capazes de discutir os problemas do nosso tempo fora dos limites axiológicos, ideológicos e culturais que, como se uns óculos coloridos se tratassem, nos impedem de ver a realidade. De certeza que o leitor conhece respostas mecânicas (ideologicamente formatadas, não importa agora o género, tipo ou qualidade dessas ideologias) a toda uma série de questões do nosso tempo, para as quais temos sempre respostas rápidas: a culpa é sempre destes ou daqueles, é do sistema ou da globalização, é desta ou daquela religião... De certa forma, este tipo de atitude é mais confortável, é mais simples, é mais cómoda: não temos de pensar muito, não temos de questionar as verdades feitas do nosso tempo, não temos de pôr em causa as nossas crenças e os nossos valores (coisa que dá trabalho e exige esforço, liberdade de pensamento e, acima de tudo, espírito crítico), não precisamos de discutir as opções dos nossos líderes e limitamo-nos a continuar à espera que eles actuem como os “pais-que-providenciam-o-pão-nosso-de-cada-dia”. Se, desde que nascemos, nos puserem à frente uns óculos coloridos, dos quais não nos apercebemos, que nos fazem ver tudo a azul, verde ou vermelho, não questionamos que a realidade seja, aos nossos olhos, azul, verde ou vermelha. De certa forma, o poder do formato cultural e civilizacional tem o mesmo efeito. Esse formato era tão forte para os romanos quanto o é para nós, apesar do formato actual ser profundamente diferente do deles. Simplesmente, se não conseguirmos olhar a realidade para além das limitações que esse formato nos impõe, só nos iremos aperceber da mudança tarde demais. Os valores, os princípios, a ética, no fundo tudo aquilo que jamais temos a coragem de questionar, de tal forma as convenções se cristalizam, são, em grande parte, aquilo que nos impede de antecipar mudanças estruturais profundas como estas que estou aqui a referir. No fundo, há que dizê-lo: a maior parte dos habitantes deste planeta olham, raciocinam, percepcionam e dão sentido ao mundo no quadro de uma nação, de uma religião ou de uma civilização. São raros aqueles que percebem o mundo fora destes limites culturais. Por isso, não é estranho ouvirmos alguém apontar o dedo, de forma ignorante, e dizer que a culpa é dos EUA ou da China, ou do Catolicismo ou do Islão, ou dos ricos ou dos pobres. Tolos, uns e outros, que não conseguem ver para além dos limites do formato civilizacional em que foram fechados. Enquanto não se libertarem desses casulos ideológicos, jamais poderão compreender o que se está a passar no mundo. E, enquanto se entretêm na tentativa de encontrar respostas (simples), normalmente com bodes expiatórios pré-definidos e ajustados à satisfação das suas visões particulares, num evidente ciclo tautológico, em que a lógica da ideologia justifica o dedo apontado e o dedo apontado justifica a lógica ideológica, são incapazes de perceber de facto porque razão o mundo está a mudar tão intensa, profunda e radicalmente. Conseguem, assim, encontrar respostas particulares e fáceis para questões que exigem um patamar analítico muito mais abrangente, complexo, integrado e objectivo.
E enquanto barafustam, porque a realidade lhes está a escapar das mãos, continuam a não perceber nada do que efectivamente se está a passar à nossa volta, à escala mundial. Continuam a esbracejar e a apontar o dedo em certas direcções, sem perceberem que estão a pedir “SOL NA EIRA E CHUVA NO NABAL” (há décadas) e que há um evidente confronto de interesses (económicos) e de valores (políticos e ideológicos) que ninguém quer discutir, debater ou pensar, principalmente porque esse confronto de interesses e de valores nos colocam perante consequências horríveis, de solução aparentemente impossível, com dilemas civilizacionais profundos, que nos atingem directamente (A TODOS NÓS) nos planos da ética, dos direitos, dos deveres, dos patamares de liberdade e de igualdade a que estamos habituados e a que aspiramos.
Nas próximas décadas o mundo irá mudar muito e não creio que as probabilidades apontem no sentido das melhorias. Muito pelo contrário. Todos nós iremos assistir a um mundo em convulsões, com elevadas probabilidades de se cruzarem fenómenos globais de insegurança, criminalidade, guerra, barbárie, genocídio, fome, ódio, racismo, xenofobia, medo, incivilidade... E tudo a uma escala nunca antes visionada. Por isso, se anda preocupado com o que se está a passar à sua volta (desemprego, precariedade laboral, criminalidade, corrupção, iliteracia, massificação da loucura, da ignorância e da boçalidade, desmantelamento do Estado Providência, baixa da natalidade, etc.), não se preocupe porque o que aí vem fará de todas estas preocupações uma autêntica brincadeira de crianças.
Apesar de todas estas mudanças, quando pensamos no nosso tempo, raros são os que pensam em mudanças radicais ao ponto de se observarem alterações estruturais, ao ponto do nosso mundo ruir por completo, surgindo das suas cinzas algo de muito diferente. Quantos serão aqueles que acreditam que o mundo, tal como o conhecemos, permanecerá “estruturalmente igual” para os nossos filhos e netos, como se apresenta aos nossos olhos? A maior parte daqueles que perdem algum do seu tempo a pensar o futuro tem tendência para ver um mundo semelhante ao nosso, eventualmente mais justo ou mais injusto, mais igualitário ou menos igualitário, mais desenvolvido e equilibrado ou menos desenvolvido e equilibrado, mas certamente mais dominado pela tecnologia.
No entanto, quantos pensarão que o mundo, nas próximas décadas, poderá sofrer mudanças radicais tão fortes, tão estruturais e tão profundas (ou mais) do que as ocorreram na transição do império romano ocidental para o período de dez séculos que ficou conhecido pela designação de Idade Média?
A questão não é irrelevante e só os distraídos poderão pensar que assim é. No fundo, a questão central é esta: qual a nossa capacidade de antecipar, prever, conhecer (ainda que no campo das probabilidades) o nosso futuro? Será que o homem moderno possui mecanismos, instrumentos de análise e conhecimentos que permitam uma percepção razoável da mudança social que se aproxima, principalmente quando essa mudança social se prefigura como sendo de natureza estrutural? Porque, entendamo-nos, apenas poderemos ter alguma capacidade de intervenção sobre a mudança se tivermos uma percepção mínima do que se aproxima. De outra forma, se continuarmos distraídos, seremos apanhados pela mudança dos tempos com toda a força, como brinquedos infantilmente manipuláveis.
Vejamos a questão através de um exemplo: Quantos cidadãos romanos, de meados do Séc. V, terão antecipado o fim do império romano ocidental? Será que, apesar de todas as mudanças, convulsões e problemas existentes no império romano do ocidente, algum cidadão foi capaz de prever a ruína total do império, com a transformação radical do seu mundo económico, político, cultural e social em algo de profundamente distinto, no espaço de poucos anos ou décadas? E será que, nos dias que correm, seríamos capazes de antecipar algo de semelhante se mudanças desse tipo fossem iminentes?
Vejamos um exemplo bem mais próximo de nós: No final dos anos 80, todo um bloco económico, civilizacional, cultural e político, o império Soviético, ruiu por completo em pouco mais de um ano. Será que alguém se recorda dos Economistas, Sociólogos, Historiadores, Politólogos, Filósofos, Intelectuais ou Pensadores que tenham antecipado a queda do império Soviético? Mesmo aqueles que, por motivações de discordância política, ideológica ou económica com esse Bloco, tivessem razões para desejar semelhante ruína, jamais apareceu alguém a antecipar a queda do bloco comunista a não ser quando ele já era evidente aos olhos de todo o mundo.
Por isso, uma vez mais, voltamos à questão central: apesar de todo o conhecimento acumulado e de todos os instrumentos analíticos que estão ao nosso dispor, ninguém foi capaz de antecipar uma mudança tão significativa, profunda, abrangente e com consequências tão dramáticas como aquelas a que assistimos no final de 1989 e princípios de 1990. E, para os mais distraídos, convém recordar que o Bloco Soviético era SÓ uma das grandes potências mundiais, com tudo o que isso significa no plano do poder geoestratégico, da influência das políticas nacionais e internacionais, da economia mundial, das escolhas e das alternativas políticas para o mundo. Como foi possível que um bloco todo-poderoso desaparecesse assim, numa decadência tão estrepitosa, sem que ninguém tivesse sido capaz de o antecipar, de o prever? Uma coisa é certa: ao contrário de nós, os nossos antepassados romanos não tinham ao seu dispor os instrumentos analíticos da ciência que hoje estão ao nosso dispor. E, no entanto…?!!!! O que terá falhado para que ninguém tivesse antecipado semelhantes mudanças?
Na minha perspectiva, é possível, com algum grau de razoabilidade, antecipar mudanças estruturais significativas, mas apenas e quando somos capazes de pensar criticamente a realidade social para além das limitações que nos são impostas pelo formato civilizacional e pelo caldo cultural em que crescemos e vivemos. Julgo que o mundo em que vivemos se aproxima de mudanças radicais muito semelhantes às que se viveram aquando da queda do império romano e ao surgimento da Idade Média, sendo que, essas mudanças irão ocorrer nas próximas décadas (provavelmente por volta de meados do Séc. XXI), mas apresentar-se-ão numa dimensão jamais vista pela humanidade, tendo em conta, por um lado, a natureza da sociedade global em que vivemos e, por outro, a dimensão absurda do volume demográfico existente actualmente no Planeta Terra.
Nunca fui catastrofista e muito menos adepto de teorias da conspiração. Prefiro analisar, pensar e discutir a realidade à luz de pressupostos científicos, baseando-me em factos, na clarividência dos sábios e na objectividade das técnicas e dos métodos. Por isso, peço desde já aos meus leitores que não confundam estas palavras com visões mirabolantes, crenças em conspirações tenebrosas ou mesmo um pessimismo meramente irrealista.
Também quero desde já deixar bem claro que não estou a defender a tese, e muito menos a fazer a apologia, de um regresso à Idade Média. Se pensarmos bem, a Idade Média representou uma autêntica implosão civilizacional: o mundo contraiu-se de tal forma que as esferas social, económica, política e cultural assumiram outras estruturas, outras regras, outras crenças, outras práticas. Um cidadão romano do início do Séc. V dificilmente se poderia integrar no mundo no início do Séc. VI, tão profundas tinham sido as mudanças. As instituições políticas, as leis, o mercado, a ordem pública, a estrutura social, as práticas culturais, os costumes, as tradições, tudo isto tinha sofrido alterações significativas ou estava a caminho de as sofrer.
Em certa medida podemos dizer que o Império Romano Ocidental se encontrava, à sua escala, à sua dimensão e no seu contexto, “globalizado”. E, por isso, também podemos dizer em certa medida, que a Idade Média significou uma implosão dessa “globalização”, implosão essa que se traduziu numa redução significativa dos conhecimentos e das técnicas, principalmente a nível cultural, nas artes, na Engenharia Civil, na Arquitectura, no Direito, na Filosofia (e como tal na proto-ciência da época) e na Literatura, mas também uma implosão no mundo social, que passou a ser territorial, económica e socialmente mais fechado, limitado, inseguro, pobre e inculto.
Porque razão não somos capazes de antecipar mudanças tão graves quando elas se aproximam? Seremos capazes de as evitar ou a marcha da História é imparável? Julgo que um dos aspectos que mais dificultam a nossa capacidade de antecipar o futuro (dentro de alguns limites razoáveis), decorre das limitações civilizacionais em que fomos socializados e em que vivemos. Os romanos não foram capazes de antecipar mudanças tão radicais, assim como os poderes do Kremlin não foram capazes de evitar a queda do bloco Soviético, porque todos estamos imersos num caldo cultural, composto de formas de pensar, sentir e perceber o mundo que integram um FORMATO que nos impede de questionar toda uma série de valores, princípios e convenções. Só podemos ver mais além se formos capazes de discutir os problemas do nosso tempo fora dos limites axiológicos, ideológicos e culturais que, como se uns óculos coloridos se tratassem, nos impedem de ver a realidade. De certeza que o leitor conhece respostas mecânicas (ideologicamente formatadas, não importa agora o género, tipo ou qualidade dessas ideologias) a toda uma série de questões do nosso tempo, para as quais temos sempre respostas rápidas: a culpa é sempre destes ou daqueles, é do sistema ou da globalização, é desta ou daquela religião... De certa forma, este tipo de atitude é mais confortável, é mais simples, é mais cómoda: não temos de pensar muito, não temos de questionar as verdades feitas do nosso tempo, não temos de pôr em causa as nossas crenças e os nossos valores (coisa que dá trabalho e exige esforço, liberdade de pensamento e, acima de tudo, espírito crítico), não precisamos de discutir as opções dos nossos líderes e limitamo-nos a continuar à espera que eles actuem como os “pais-que-providenciam-o-pão-nosso-de-cada-dia”. Se, desde que nascemos, nos puserem à frente uns óculos coloridos, dos quais não nos apercebemos, que nos fazem ver tudo a azul, verde ou vermelho, não questionamos que a realidade seja, aos nossos olhos, azul, verde ou vermelha. De certa forma, o poder do formato cultural e civilizacional tem o mesmo efeito. Esse formato era tão forte para os romanos quanto o é para nós, apesar do formato actual ser profundamente diferente do deles. Simplesmente, se não conseguirmos olhar a realidade para além das limitações que esse formato nos impõe, só nos iremos aperceber da mudança tarde demais. Os valores, os princípios, a ética, no fundo tudo aquilo que jamais temos a coragem de questionar, de tal forma as convenções se cristalizam, são, em grande parte, aquilo que nos impede de antecipar mudanças estruturais profundas como estas que estou aqui a referir. No fundo, há que dizê-lo: a maior parte dos habitantes deste planeta olham, raciocinam, percepcionam e dão sentido ao mundo no quadro de uma nação, de uma religião ou de uma civilização. São raros aqueles que percebem o mundo fora destes limites culturais. Por isso, não é estranho ouvirmos alguém apontar o dedo, de forma ignorante, e dizer que a culpa é dos EUA ou da China, ou do Catolicismo ou do Islão, ou dos ricos ou dos pobres. Tolos, uns e outros, que não conseguem ver para além dos limites do formato civilizacional em que foram fechados. Enquanto não se libertarem desses casulos ideológicos, jamais poderão compreender o que se está a passar no mundo. E, enquanto se entretêm na tentativa de encontrar respostas (simples), normalmente com bodes expiatórios pré-definidos e ajustados à satisfação das suas visões particulares, num evidente ciclo tautológico, em que a lógica da ideologia justifica o dedo apontado e o dedo apontado justifica a lógica ideológica, são incapazes de perceber de facto porque razão o mundo está a mudar tão intensa, profunda e radicalmente. Conseguem, assim, encontrar respostas particulares e fáceis para questões que exigem um patamar analítico muito mais abrangente, complexo, integrado e objectivo.
E enquanto barafustam, porque a realidade lhes está a escapar das mãos, continuam a não perceber nada do que efectivamente se está a passar à nossa volta, à escala mundial. Continuam a esbracejar e a apontar o dedo em certas direcções, sem perceberem que estão a pedir “SOL NA EIRA E CHUVA NO NABAL” (há décadas) e que há um evidente confronto de interesses (económicos) e de valores (políticos e ideológicos) que ninguém quer discutir, debater ou pensar, principalmente porque esse confronto de interesses e de valores nos colocam perante consequências horríveis, de solução aparentemente impossível, com dilemas civilizacionais profundos, que nos atingem directamente (A TODOS NÓS) nos planos da ética, dos direitos, dos deveres, dos patamares de liberdade e de igualdade a que estamos habituados e a que aspiramos.
Nas próximas décadas o mundo irá mudar muito e não creio que as probabilidades apontem no sentido das melhorias. Muito pelo contrário. Todos nós iremos assistir a um mundo em convulsões, com elevadas probabilidades de se cruzarem fenómenos globais de insegurança, criminalidade, guerra, barbárie, genocídio, fome, ódio, racismo, xenofobia, medo, incivilidade... E tudo a uma escala nunca antes visionada. Por isso, se anda preocupado com o que se está a passar à sua volta (desemprego, precariedade laboral, criminalidade, corrupção, iliteracia, massificação da loucura, da ignorância e da boçalidade, desmantelamento do Estado Providência, baixa da natalidade, etc.), não se preocupe porque o que aí vem fará de todas estas preocupações uma autêntica brincadeira de crianças.
12 comentários:
Uma coisa: falaste muito e não disseste nada!
Mas já agora, ...de quem achas que é a responsabilidade dessa desgraceira toda global? não é de Bush´s e companhia ? UE neo-liberal, Bildergerg´s e companhia ???
A previsão da decadência dos impérios não se consegue fazer, além da razão que apontou - imersão do sujeito no caldo cultural - porque as ciências sociais não são ciências, são áreas de saber que de capacidade preditiva nada têm a não ser idealizações: veja o caso dos sociólogos e psicologos (o caso da psicologia chega a ser patético) com as suas múltiplas teorizitas impotentes perante a indiferença da realidade.
A talho de foice estou a ler agora uma obrazita dum tipo que está na moda e que trata precisamente do problema que retratou: Slöterdijk, P. (202 [1989]). A Mobilização Infinita. Para uma crítica da cinética política. Lisboa: Relógio d'Água (Orig.: Eurotaoismus - Zur Kritik der Politischen Kinetik, Surkamp Verlag Frankfurt am Main, 1989). Diz ele que a tendência para o "sempre mais" a todos os níveis que carateriza a idade pós-moderna das sociedades ocidentais assenta no "ser-para-o-movimento". A linguagem dos filósfos sempre foi enigmática. Mas os modelos nos quais pega, p.ex., a teoria marxista da formação do valor servem de apoio à tese na medida em que a abstracção alienadora do ser humano decorrente da equivalência forçada entre dinheiro e mercadoria já assentaria, diz ele, no ser-para-o-movimento e portanto já anunciaria a idade pós-moderna (seja lá isso o que fôr) das sociedades actuais caracterizadas pelo excesso em todas as suas actividades, ressuscitando aqui a tese da vontade de poder, de Nietzsche. O homem aconselha-nos a reler o Manifesto do Partido Comunista (credo!) como forma de compreender o ser-para-o-movimento excessivo na sua natureza no qual já estaria "previsto" (está a ver?) o modelo dos excessos ocidentais (e orientais também) de hoje. Presumo que o signo maior aqui seria a internacional socialista que já anunciaria um movimento de massas transfronteiriço (acho eu, sei lá), típico por exemplo do capitalismo.
Mugabe,
Claro que escrevi muito e não disse nada. Eu sei que ficou muito por dizer mas isso ficará para outros posts em que irei desenvolver, aprofundar e explicar mais detalhadamente a ideia.
Este post serviu de introdução e, por isso mesmo, ficaram muitas coisas no ar. Compreendo que muitos leitores não tenham percebido o alcance mais específico do que quero dizer. Mas isso será clarificado, aos poucos, em próximas publicações.
Entretanto, a sua resposta é mais do expectável: leituras básicas, de dedo apontado a uns, sem perceber que a responsabilidade é muito maior, muito mais abrangente e que nós próprios estamos atolados nela.
No fundo, a sua resposta é típica daqueles que não conseguem entender a natureza da mudança social que se aproxima porque continuam fechados em discursos ideológicos simples, que têm o condão de dar um sentido à realidade, mas que é sempre um sentido parcial e com muita reduzida capacidade analítica. No fundo, você tem de tentar fazer o esforço para o qual eu apelo a todos: o esforço de ver mais além dos constrangimentos culturais, do formato civilizacional que nos impede de discutir ou pôr em causa toda uma série de verdades feitas.
Caro Metatheorique,
Presumo que sabe que a minha formação académica é da área das ciêcias sociais, mais concretamente a Sociologia. Não concordo, por isso, com a leitura que faz, dizendo que as mesmas não são ciências. Em relação a esta questão, no entanto, quero apenas dizer três coisas muito sumariamente: a) que a questão da natureza científica das ciências sociais não é menor; b) que essa natureza não é o centro desta questão; c) que eu compreendo as suas críticas porque eu próprio faço uma leitura muito crítica sobre a forma como se produzem os discursos sociológicos, nomeadamente pelo facto de muitos deles se encontrarem ideologicamente formatados, o que me leva a questionar a validade científica dos mesmos. Em todo o caso, ao contrário de si, considero a Sociologia, assim como a Economia, a Antropologia, a História ou a Geografia, como ciências de pleno direito.
Penso que é possível detectar sinais, analisar factos e retirar conclusões a partir da realidade envolvente. Quando falo de antecipação do futuro não estou a falar de algo semelhante à astrologia, nem algo de semelhante à Física. A esfera social, a realidade humana depende de demasiadas variáveis para podermos antecipar as coisas com rigor. Trata-se, por isso, de um discurso que assenta em probabilidades. Ora, meu caro, o domínio das probabilidades não é a-científica, antes pelo contrário. A Matemática, a mais exacta das ciências, labora e trabalha com probabilidades.
Analisar a realidade mundial actual e verificar as ameaças e os riscos que teremos de enfrentar nas próximas décadas é, por isso, uma necessidade. Presumo eu que já conhecemos demasiado bem a natureza da espécie humana e os caminhos históricos que trilhou, para não percebermos que existem probabilidades de se aproximar uma Nova Idade Média.
O problema é este: existe ou não essa possibilidade? Será irrelevante analisá-la? Se forem reduzidas as probabilidades de semelhante mudança social ocorrer, devemo-nos desinteressar do problema, assobiar para o lado e acreditar que vai continuar tudo óptimo? Mas, mesmo que as probabilidades sejam reduzidas (e olhe que eu não acredito que o sejam), o facto de semelhantes mudanças se apresentarem como estruturalmente tão catastróficas não nos devia preocupar, levando-nos a estudar e a compreender o que se aproxima?
Pois eu julgo que é isso mesmo que se verifica. As probabilidades de estarmos próximos de uma Nova Idade Média não são assim tão reduzidas como isso. A análise das causas e das consequências de semelhante mudança tem de ser feita urgentemente.
Mais, meu caro, no domínio da ciência, as interrogações devem ser feitas, mesmo quando as respostas nos parecem impossíveis ou difíceis.
Podemos não saber as respostas mas as perguntas não podem deixar de ser feitas.
Obrigado pela referência bibliográfica que introduziu e que eu não conhecia. Este e outros posts que se seguirão, sobre o mesmo assunto, decorrem da influência de vários autores que tenho lido ultimamente e que oportunamente aconselharei vivamente a todos.
A leitura dstes autores só tem reforçado aquela que é a minha interpretação da realidade social há mais de uma década. E, já agora, a talho de foice, quero dizer que eu sempre fui um optimista em relação ao futuro da humanidade.
Aos meus leitores mais críticos quero apenas deixar bem claro que todas estas preocupações são genuínas e não são despropositadas. Muito do que eu vou apresentar futuramente é, para além das minhas interpretações pessoais, o resultado das análises feitas por intelectuais, estudiosos, investigadores e cientistas de renome mundial, a maior parte deles com créditos firmados.
Peço apenas alguma paciência e alguma capacidade de leitura crítica. Pensar estas questões não é fácil, principalmente quando somos levados por caminhos em que somos obrigados a confrontar os nossos próprios valores, as nossas crenças, os nossos princípios. A todos os que continuarem a leitura dos meus posts, peço alguma clarividência e alguma capacidade para ver mais além.
Obrigado a si, metatheorique, pelo comentário e obrigado a todos os restantes leitores.
:-))
É uma evidência e o simples facto de o movimento de populações para outras áreas geográficas, pressupõe mudanças radicais na própria estrutura étnica daquelas. O problema é múltiplo, porque envolve as várias demografias a ter em conta - queda de umas, explosão de outras -, a escassez de recursos naturais - dos quais a água é o mais importante e quiçá ocasionador dos grandes conflitos do futuro -, a desertificação, etc. O Paulo apenas alerta e nem me parece pessimista. a realidade o dirá. A primeira globalização do século XVI-XVII, revolucionou a co-relação de forças a nível mundial, mas os recursos tecnológicos hoje disponíveis, propiciarão mudanças muito mais radicais. Quem disso duvidar, pode verificar o percurso trilhado desde 1970 até aos nossos dias.
Finalizando e no que respeita à análise marxista, penso ser apenas isto: uma ferramenta desadequada ao nosso tempo que hoje nada tem em comum com a realidade que o filósofo viveu. Criou conceitos de interpretação, mas tudo o resto, é pura fantasia e instrumentalização da propaganda.
Muito bem dito, caro Nuno. Estou capaz de subscrever quase tudo o que disse.
Proximamente irei acrescentar mais alguns posts em que irei desenvolver o assunto com maior especificidade. Concordo parcialmente quando diz que a água é o mais importante dos recursos naturais. É, seguramente, o mais importante, mas há outros com os quais nos devemos preocupar, recursos esse que estarão no centro das mudanças que se avizinham. Referir-me-ei a eles posteriormente.
Entretanto, concordo consigo no que respeita à importância das interpretações marxistas. Politicamente estou muito longe de Marx mas não posso deixar de dizer, por questões de objectividade, que ele foi um importantíssimo pensador (enquanto filósofo, historiador, economista e sociólogo), cujo poder analítico não deve ser menorizado. Tal como diz, acho que as leituras de Marx estão completamente desajustadas do nosso tempo.
Aliás, aqueles que me leiam, e julguem que por detrás destas análises se encontra alguém que vem anunciar o fim da globalização à luz dos pressupostos dos herdeiros de Marx, bem que pode tirar o cavalinho da chuva porque não vai aqui encontrar nada disso. Porque, uma vez mais, aqueles que clamam contra o capitalismo, mais não são do que uma parte dos tolos que continuam a olhar para a realidade à luz de critérios pré-formatados. Exige-se a todos nós, sem excepção, mais e melhor visão.
:-))
os maias, nostradamus e outro padre católico qualker já diziam o mesmo, estamos a sair da era de peixes e entrar na era de aquário, mudanças que sucedem every treze mil anos, quando o centro desta galáxia se alinha com o nosso sol, tudo mais plausível do que tamanha verborreia adolescente inconsciente da sua nulidade, mas vá, prometo que não te arranho mais esse ego que a senilidade avançada já elevou a tais epopeias de razão, ritmo e parcialidade, tudo bem equilibrado em ti, paulo "a pérola" pedroso
beij@
Meus caros senhores, tomem atenção aos vossos pressupostos. Primeiro, a primeira globalização não foi iniciada no século XV. Segundo, a medievalização da Europa deu-se depois da romanização (globalização romana) do mundo (conhecido). Terceiro, antes desta outras aconteceram. Por último, se querem ser rigorosos façam uma análise comparativa das consequências que acarretaram e então arrisquem previsões. À laia de sugestão aconselho a metodologia usada na meteorologia que alia registos comparativos e tecnologias de observação em tempo real (usem a História, a Economia e a Filosofia para complicar um pouquito as conjecturas. Sem ela era muito fácil).
Eu sei que estamos todos atolados nela,...mas de quem é a responsabilidade,...aí não sabes ou não queres dizer,...ou não te convém dizer....há aqui uma data de pseudo-intelectuais da tanga que só me fazem rir comó caraças....estão a falar da água e etc,....ó meus lindos toda a gente já sabe dessa merda toda há muito tempo, não me lichem......! digam lá mais uma larachas pseudo..para eu me rir...heheheheheh
Mugabe
Vá lendo. No fim, terá mais razões para ficar deprimido e menos para se rir.
E deixe lá as suas lérias de apontar o dedo ao neoliberalismo porque a culpa está tão repartida à Esquerda quanto à Direita.
Já se esqueceu do desastre ecológico de dimensões bíblicas que o bloco Soviético produziu? E não eram capitalistas neo-liberais, pois não?
(e não, não me estou a referir apenas a Chernobyl)
E também se deve ter esquecido de um pormenor: foram os neo-liberais que levaram a China a ter 1.3 mil milhões de habitantes? Foram os neo-liberais que levaram a Índia a ter 1.1 mil milhões de habitantes? Sabe que a Índia irá ultrapassar a China, em termos populacionais, dentro de poucas décadas?
Pense, para além das limitações das cassetes. Já devia estar farto das ouvir. Veja se consegue discernir mais além!
"Sim, eu também li aquelas histórias em que homens obrigaram outros a arrancar com os dentes os testículos de outros homens."
paulo pedroso
pessoas até a concordar cu gajo e memo assim começa as respotas sempre na negativa, virgo nitidamente virgo
"A Matemática, a mais exacta das ciências, labora e trabalha com probabilidades."
paulo pedroso
venha essa idade média you speak of então, tás com medo de alguma coisa é??
humanidade evapora-se
que chatiiiiiiiiiiice
Finalizando e no que respeita à análise marxista, penso ser apenas isto: uma ferramenta desadequada ao nosso tempo que hoje nada tem em comum com a realidade que o filósofo viveu. Criou conceitos de interpretação, mas tudo o resto, é pura fantasia e instrumentalização da propaganda.
28 de Abril de 2008 18:11
Blogger Paulo Pedroso disse...
Muito bem dito, caro Nuno. Estou capaz de subscrever quase tudo o que disse.
mixed messages=?
"que estarão no centro das mudanças que se avizinham. Referir-me-ei a eles posteriormente."
paulo pedroso,
estamos em pulgas
à espera dos proximos
desenvolvimentos
dos teus episódios
"Aliás, aqueles que me leiam bem podem tirar o cavalinho da chuva"
paulo pedroso
é o maior
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