Neste blogue praticam-se a Liberdade e o Direito de Expressão próprios das Sociedades Avançadas
Querida Lola:
Lembra-se de mim?... Sou o Serafim Saudade, fizémos, uma españolada, há 20 anos, ali para o lado do Parque... Fiquei muito preocupado consigo, ontem, ao ver a Avenida da Liberdade da arder. Só deus sabe a angústia que me deu de a menina ter sido apanhada pelas "lavaredas", nalgum vão de escada...
(Serafim Saudade, Calçada da Glória, Lisboa)
Querido Serafim:
Os registos das minhas españoladas são como os Livros de Termos da extinta Universidade Independente: ao fim de um certo tempo faço, "delete", e queimo-os logo, para não ficar afogada em melancolias de homens bons que já se foram... No tempo em que ainda havia homens, e não galheteiros proibidos pela ASAE, à espera, o tempo todo, de que lhes metam dentro palitos de ponta grossa... Claro que não fiquei presa nalgum vão de escada a arder, filho. Eu sou das finas, não sou uma puta daquelas que atacam nos Restauradores, eu só frequento a parte de cima da Avenida, perto da Vuitton, da Armani, do Deutsch Bank, e dessas marcas todas... O ideal, mesmo, é a esquina da rua das traseiras do "Diário de Notícias", a 100 metros da Dª. Senhora Câncio, se houver algum acidente, começo aos gritos, e vêm logo os guarda-costas que o Estado paga para o pau-de-cabeleira, acudirem-me... Olhe, eu sei que vai achar horrível o que eu vou escrever, mas, para mim, que passo a noite neste deserto que é a Lisboa depois das 22.00 h..., querido, por mim, os que pegaram fogo aqueles pardieiros lá de baixo, só fizeram o que se faz, há muito, em Milão: sempre que um processo não avançava, deitava-se fogo à baiúca, e construía-se a seguir!... É o Método Champalimaud, e deve escrever um email à Drª. Leonor Beleza, e ao Dr. Dias Loureiro, que eles explicam-lhe já como se faz e como funciona. No fundo, eu queria era que incendiassem, mas era, os prédios não-devolutos, aqueles que estão ocupados pelas agências de agiotagem, pelos seguros, pelos bancos, pelas empresas, pelos escritórios, pelas lojas de merdunças, e que fazem que a cidade fique um sahara, a partir do cair da noite. Que pegassem fogo a essa cidade morta, e deixassem em paz os vãos de escada dos prédios devolutos, que é aí que a cidade ganha actividade, pela noite dentro. Cada prédio em ruínas é uma Nova Iorque fora de horas, cheia de vida e comércio... tradicional, maridos que ali descarregam nos "air-bags" das travecas toda a violência doméstica que, em caso contrário, iriam praticar nas esposas e nos filhos, estudantes longe de casa, que vêm procurar em nós aquilo que as namoradas não fazem, árbitros desesperados do "Lohby"... meu deus, cada vão de escada abandonado é como um recife de coral, um pequeno paraíso a preservar!... De cada vez que arde um, perdem-se não sei quantos espécies endémicas. Adorei ver aquela velhinha, que saiu de casa só com as chaves: somos grandes conhecidas, e, quando eu era mais nova, era para o andar dela que tocava, para me abrir a porta da rua.... dizia-lhe sempre que era engano, mas ela, muito caridosa, facilitava-me sempre a vida. Também fui honesta com ela, e engoli sempre, não lhe sujando o patamar!... Quanto ao resto, aquelas montras de néons, e vazias a noite inteira, aqueles balcões muito polidos, aqueles monitores tft e poltronas "hi-tec", à média luz... querido, era só organizarem uma brigada do parte-vidro, deita-gasolina e acende um fósforo, que eu me tornaria imediatamente numa Nera Burning Lisbon, já hoje. Se calhar, nem era preciso, porque já corre aí o boato da electricidade estática ligada aos incêndios, sim, filhos, a electricidade estáticas de HORAS e HORAS, num frenético mete-e-tira... Kisses!...
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